Cálculo urinário na gestação

Urologia
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Cálculo urinário na gestação - Causas, Sintomas, Diagnóstico e Tratamento

A litíase urinária, mais comumente conhecida por pedra nos rins, é frequentemente diagnosticada durante a gestação. Apesar da gravidez não ser um fator predisponente à esta condição, alguns fatores presentes durante este período contribuem para a sua manifestação. Quando não há sintomas associados, não há necessidade de medidas adicionais, realizando-se tratamento clínico e dando-se continuidade ao pré-natal normal. No entanto, quando há presença de sintomas ou complicações, a intervenção imediata faz-se necessária. A ocorrência de cálculos renais sintomáticos durante a gestação traz preocupações adicionais pois, além do sofrimento e riscos à gestante, há também aumento significativo do risco de abortamento ou parto prematuro.

Causas
Durante a gestação, ocorrem alterações fisiológicas e anatômicas em todo o trato urinário. Os rins são deslocados para frente pelo feto e aumentam de tamanho em cerca de um centímetro. Esta dilatação do trato urinário superior, denominada “hidronefrose fisiológica” causa redução no fluxo urinário, atuando como um grande fator de risco para a ocorrência de cálculos e infecções urinárias. O sistema cardiovascular também sofre alterações, com aumento da atividade cardíaca e consequente aumento da taxa de filtração dos rins em até 65%, resultando em mudanças na excreção renal de eletrólitos. O aumento da produção de vitamina D pela placenta, bem como a eventual suplementação de cálcio durante a gestação contribuem para o aumento da presença de cálcio na urina. Ocorre, ainda, o aumento do pH urinário e crescente eliminação de compostos que originalmente atuariam como inibidores da formação de pedras. Todos estes fatores irão contribuir para a cristalização urinária, favorecendo a formação dos cálculos.

Sintomas
A dor da cólica renal não é causada pela presença do cálculo em si, mas sim pela migração da pedra e obstrução do trato urinário, causando distensão do ureter e rim. Os sintomas incluem quadro de dor lombar, irradiando para flanco, fossa ilíaca ou região genital. Pode haver sangue na urina, além de aumento na frequência da micção. Náuseas e vômitos podem ocorrer devido à dor intensa. Diante deste contexto, deve-se, inicialmente, realizar medidas de suporte, incluindo uso de antieméticos, analgésicos e hidratação, se necessário. As medicações utilizadas devem ser selecionadas levando-se em conta seu efeito direto, possíveis efeitos colaterais e segurança de uso para o feto. A cólica renal e suas complicações elevam o risco de trabalho de parto prematuro, que pode ocorrer em até 67% dos casos.

Diagnóstico
Mediante a suspeita clínica, exames complementares devem ser realizados para confirmar o diagnóstico de cálculo renal.
- Urinálise e Urocultura: exames realizados com amostra de urina, para verificar a presença de sangue, excesso de cálcio, creatinina, infecções e composição do possível cálculo.
- Tomografia de abdômen sem contraste: apesar de ser o exame considerada o padrão ouro na avaliação de um indivíduo com cólica renal, este exame dever ser evitado durante a gestação, principalmente no primeiro trimestre, pelos riscos de malformações em fetos expostos à radiação. Este exame só é indicado para grávidas no 2º e 3º trimestres de gestação, realizado com baixas doses de radiação. 
- Ultrassonografia de abdome total: exame de escolha para gestantes com suspeita de cólica renal. Este exame será útil para demonstrar sinais indiretos de obstrução, porém, apresenta baixa sensibilidade, não sendo capaz de fornecer diagnóstico conclusivo.

Tratamento clínico
O tratamento inicial é clínico e visa promover conforto para a paciente. Analgésicos, antieméticos, antiespasmódicos, antiinflamatórios e corticóides são frequentemente empregados. Em geral, há maior taxa de eliminação de cálculos em gestantes pela dilatação fisiológica do sistema urinário, sendo eliminados naturalmente em 80% das pacientes submetidas a tratamento clínico. A hidratação auxilia nesta eliminação, sendo recomendada a ingestão de líquido em grande quantidade neste período. Medicações orais específicas para expulsão dos cálculos, comumente utilizadas em indivíduos normais, não são recomendadas para grávidas.

Tratamento cirúrgico
Após analgesia e compensação clínica da gestante, deve-se estabelecer a estratégia terapêutica. Caso uma das condições abaixo esteja presente, será necessária intervenção imediata:
- Presença de infecção urinária associada à obstrução por cálculo
- Dor intratável mesmo após tomadas as medidas clínicas 
- Insuficiência renal aguda (com obstrução bilateral ou em gestantes com rim único) 
- Grande quantidade de contrações uterinas ocorrendo prematuramente

Dentre as possibilidades de tratamento cirúrgico, destacam-se:
- Implantação de cateter duplo J: promove desobstrução da unidade renal, sem retirada efetiva do cálculo. O cateter deve ser trocado periodicamente, devido ao elevado risco de incrustação do cateter em gestantes
- Nefrostomia percutânea: promove desobstrução da unidade renal através da colocação de sonda no rim, através de incisão na pele das costas da paciente. Também considerada medida paliativa, pois não há retirada efetiva do cálculo. 
- Cirurgia aberta/laparoscópica: procedimento cirúrgico para remoção dos cálculos. Raramente utilizados, apenas em situações de exceção. <br>
- Cirurgia renal percutânea: procedimento cirúrgico minimamente invasivo que visa o acesso direto aos rins com a introdução de endoscópio em incisão realizada através da pele do paciente.>
- Ureteroscopia: procedimento minimamente invasivo realizado através da passagem de endoscópio pela uretra da paciente. Atualmente considerado padrão ouro no tratamento da litíase em gestantes, por se tratar de método seguro e eficaz para remoção de cálculos.


- Litotripsia Extracorpórea por Ondas de Choque: altamente contraindicada durante a gestação, devido ao risco de abortamento e descolamento de placenta.

Se possível, busca-se adiar a cirurgia para o 2º trimestre de gestação. Caso a intervenção cirúrgica seja necessária, a anestesia regional (raquianestesia/peridural) é a primeira escolha.

Conclusão

A litíase urinária e suas complicações ocorrem com frequência relativamente elevada durante a gestação. A abordagem destas pacientes mostra-se desafiadora desde o diagnóstico até a definição terapêutica, bem como nos cuidados obstétricos. O reconhecimento desta doença, suas complicações e peculiaridades na gestação é de fundamental importância para o obstetra, urologista, nefrologista e todos os profissionais envolvidos no tratamento destas gestantes.

 

Texto adaptado de publicação científica: KORKES, F., RAUEN, E.C., HEILBERG, I.P. Litíase Urinária e Gestação. Jornal Brasileiro de Nefrologia. 2014;36(3):389-395. DOI: 10.5935/0101-2800.20140055

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